RINOCERONTES

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O conjunto de crônicas do livro é uma seleção das que publiquei no jornal Primeira Página (São Carlos, São Paulo), entre 2007 e 2011. E uma das melhores descrições desse gênero literário, em contraste à ficção, foi feita por Chesterton – ainda que não estivesse a falar de crônicas:
"Uma coisa é descrever uma entrevista com uma górgona ou um grifo, criaturas que não existem; outra coisa é descobrir que o rinoceronte existe e depois sentir prazer pelo fato de que ele parece um animal que não existe." *
Impressões e reflexões a partir de situações reais, mas que de tão inusitadas parecem ficcionais. Isso é crônica. A mesma ideia do rinoceronte de Albrecht Dürer (1515), que ilustra a capa. Desde o Império Romano, não se viu na Europa um rinoceronte vivo até que o Rei de Cambaia (Índia) presenteou Manuel I com o que chamavam de “unicórnio”. O Rei de Portugal, então, enviou o animal ao Papa Leão X, mas o navio afundou. **
Dürer não chegou a ver o rinoceronte, e desenhou com base em descrições e rascunhos alheios. Sua xilogravura, porém, apesar das incorreções anatômicas, permaneceu como modelo até o século XVIII e influenciou profundamente o imaginário europeu. É um marco artístico que reforça a metáfora: crônicas são unicórnios que existem. No livro, assim, há quarenta dos meus rinocerontes, divididos em “Cativeiro” (prosa tradicional, com um tema de cada vez) e “Manada livre” (textos fragmentados e entrevistas, sem padrão de formato).
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* CHESTERTON, Gilbert K. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008. p. 21.
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** Loss of Lisbon Rhinoceros (Walton Ford, 2008). Paul Kismin Gallery.